Lola
mifepristona + misoprostol
2017 Brazil
Sou casada há 10 anos e tenho um filho de quase 3 anos. Meu casamento é estável, sou funcionária pública. Não tenho grandes preocupações financeiras ou emocionais. Descobri a gravidez no dia 27/dez/16, estava em viagem de férias com a minha família. A minha menstruação estava atrasada há 1 semana e comecei a sentir os conhecidos enjoos. Comprei um teste de farmácia e deu positivo, pelas minhas contas, estava com cerca de 5 semanas. Na hora, fiquei muito nervosa, contei para o meu marido e ele ficou feliz, pois sempre foi da vontade dele termos um segundo filho (e eu sempre disse que não queria). Me deixei levar pela euforia dele e não pensei em aborto no primeiro momento. Entretanto, só conseguia pensar nos aspectos negativos da gravidez. Talvez seja relevante dizer que a minha primeira gravidez não foi planejada, veio em um momento de muito mais instabilidade financeira do meu casamento, mas nunca pensei no aborto. Foi uma gravidez tranquila, sem intercorrências, que teve como desfecho um parto natural rápido e sem qualquer interferência médica. Amamentei meu filho até os 2 anos e meio. Digo isso para ressaltar que nunca tive qualquer problema relevante em relação aos principais aspectos ligados à maternidade: gestação, parto, amamentação. Mas, nessa segunda gravidez, pouco depois desse primeiro momento de euforia do meu marido, a ideia de ter outro filho começou a me incomodar muito. Fiz o teste de farmácia por volta das 19h, jantamos, fomos para o hotel e, depois que o nosso filho dormiu, disse para o meu marido que não queria aquela gravidez. Ele ficou um pouco chocado, pediu para que voltássemos a conversar sobre o assunto no final do dia seguinte, para que nós dois pudéssemos digerir a situação. Combinamos de não falar sobre o assunto durante o dia seguinte e de, principalmente, não comentar nada com o nosso filho. Na noite do dia seguinte reafirmei a minha posição. Ele disse que gostaria de ter o segundo filho, mas que apoiaria a minha decisão de abortar, se essa fosse mesmo a minha decisão final. Naquela mesma noite do dia 28 comecei a pesquisar sobre aborto, mandei e-mail para uma amiga que eu sabia que já tinha feito um aborto perguntando se ela tinha algum contato para conseguir o medicamento e, felizmente, encontrei o site da Women Help Women. A WHW é uma ONG que envia os medicamentos abortivos para mulheres e as auxilia em todo o processo de abortamento, fornecendo informações e apoio. Além do misoprostol (que é o princípio ativo do Cytotec), eles enviam também a mifepristona (que é bem difícil de conseguir no mercado paralelo no Brasil); esse esquema é o preconizado pela OMS para aborto farmacológico por ter menores chances de falha do que o uso do misoprostol apenas. Para que eles enviem os medicamentos é necessário fazer uma doação de 75 euros (menos de 300 reais) pelo cartão de crédito internacional. Fiz todos os procedimentos e eles postaram os medicamentos no dia 2/jan/17, o prazo para chegar na minha casa era 12/jan, mandaram o código de rastreamento dos correios. Paralelamente, corri atrás do contato fornecido pela minha amiga, mas não consegui falar com o cara. Decidi confiar na WHW e contar que o medicamento enviado por eles chegaria na minha casa conforme o combinado. Daí pra frente as férias transcorreram bem, uns dias eu me sentia super confiante, outros, nem tanto; eu e o meu marido combinamos de conversar o mínimo possível sobre o assunto. Voltei para casa e os medicamentos chegaram no dia 10/jan. Foi um momento de super alívio quando abri o pacote e encontrei os comprimidos lá. Minha maior angústia do dia em que fiz o teste até então era se os medicamentos chegariam e qual seria o meu plano B (nunca tive um plano B). O pessoal da WHW me mandou o protocolo de utilização dos medicamentos, que eu segui a risca: engolir o comprimido de mifepristona com água (que fiz na noite do dia 10/jan) e, 24h depois, colocar os 4 comprimidos de misoprostol na bochecha, deixar derreter por 30 min e engolir os restos depois (que fiz na noite do dia 11/jan, estava então com 7 para 8 semanas); não recomendam jejum. A mifepristona é um inibidor de progesterona, hormônio importante para a manutenção da gravidez, e faz com que o útero responda melhor ao misoprostol, que tem a função de fazer o útero contrair e expulsar todos os produtos da gravidez (só depois de tomar o misoprostol que começa o sangramento). Decidi tomar os medicamentos de noite, depois do meu filho dormir, para ter mais tranquilidade. Coloquei os comprimidos de misoprostol na boca por volta das 11h. Fiquei vendo TV até as 00h30min, quando fui deitar. Estava bastante tranquila e confiante, mas não consegui pegar no sono. A 1h comecei a sentir cólicas mas continuei deitada e acabei dormindo um pouco. Acordei as 3h sem sentir nada, mas, quando levantei da cama, voltei a sentir as cólicas. Fui no banheiro e a minha calcinha estava limpa, sentei no vaso e expeli instantaneamente uma coisa grande, quando olhei no vaso, era redondo e tinha umas gosmas brancas, descrição compatível com o saco gestacional. Começou então um sangramento não muito intenso. Fiquei lendo um pouco na sala, sentia uma cólica moderada, totalmente suportável; por volta das 4h fui novamente ao banheiro e expeli mais sangue. Estava sempre olhando o papel higiênico antes de jogar fora, e dessa vez, quando olhei o papel, estava lá o embrião. Já com um formato bem sugestivo, cabeça, braços, pernas, o local do olho mais escurecido. Fiquei bastante tempo olhando, estava praticamente inteiro. Sou bióloga e, inicialmente, senti uma grande curiosidade por aquilo. Depois senti um certo estranhamento, chorei um pouco, mas não sei dizer exatamente porque, joguei o papel no vaso e ainda fiquei olhando para ele dentro do vaso um bom tempo. Dei descarga e fui dormir com uma sensação imensa de alívio, foi bom ter visto o embrião, pois tinha certeza que não estava mais grávida. Tive um sono pesado e ininterrupto até as 8h, quando meu filho acordou e veio me chamar. Acordei muito bem disposta, sem cólica e sem enjoo. Durante todo o processo só senti cólicas, O sangramento estava moderado e decidi que dava para ir trabalhar normalmente. Vida que segue! Não me senti culpada, me senti libertada. Não tenho nenhuma religião que me pressione espiritualmente contra o aborto, também não acredito que um aborto antes de 12 semanas seja um assassinato. Então, diante da minha vontade de não ter outro filho, não havia nada que me impedisse de fazer o aborto. Ou melhor, tinha uma lei, redigida por homens (brancos, ricos e conservadores), que, aliás, são muito mais afeitos a abortos que as mulheres. Meu pai, por exemplo, me abortou quando eu tinha cerca de 12 anos: desapareceu pra nunca mais dar as caras. Meu marido foi abortado pelo pai mais precocemente: nem o nome do pai na certidão de nascimento ele tem. Não podemos aceitar que nossos corpos sejam território público, cada mulher deve ter o direito de decidir sobre o seu corpo e sobre o seu futuro! Legalização do aborto já!!!
Foi excelente. Usei 1 comprimido de mifepristona e 4 de misoprostol, o esquema adotado nos países em que o aborto é legalizado.
Did the illegality of your abortion affect your feelings?
Sem dúvida. A ilegalidade colabora para uma demonização sem sentido. Faz com que seja difícil conseguir o medicamento original e informações confiáveis. Traz insegurança à mulher, quando ela precisa de apoio.
How did other people react to your abortion?
Poucas pessoas ficaram sabendo, apenas o meu marido e uma amiga.
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