Joana
versão corrigida do relato
2010 Brésil
Eu fiz um aborto do #meuamigosecreto. Meu amigo secreto deu em cima de mim por um ano antes de conseguir algo. Meu amigo secreto sabia que eu era casada. Meu amigo secreto sabia que eu não estava bem. Nem na vida pessoal, nem na vida profissional. Não apenas porque eu dizia (várias vezes), mas porque era claro. Após um assalto traumático que me dez perder quase tudo o que eu tinha, várias mudanças que se seguiram a isso, desempregada contando apenas com um "estágio" e após ter perdido injustamente a vaga em um concurso público, eu estava diagnosticada com depressão. Emagreci 10 kilos naquele semestre. Era visível e hoje mal compreendo como alguém pode se interessar sexualmente por alguém naquele estado. Pensando bem, hoje compreendo. Era uma situação prática para ele. Eu era estagiária na empresa na qual o meu amigo secreto trabalhava. Uma clara diferença de posição que lhe deu segurança para insistir em suas investidas, mesmo diante das minhas negativas. Acreditei. Após ficar claro que o casamento caminhava para o fim que me parecia necessário para tomar o caminho profissional que eu preferia, uma vez que o meu companheiro mais uma vez anunciou que se mudaria para mais outra cidade, cedi. O meu amigo secreto dizia que era um momento só nosso. Ele se dizia apaixonado. Mas, ao mesmo tempo, ele dizia (repetidas vezes) que queria ficar sozinho, que precisava se encontrar. Eu, carente, depressiva, acreditei. Mas ocorre que ficar sozinho para ele era ficar com outra ao mesmo. Só que eu não sabia. Enquanto isso, eu, que me sentia culpada por tudo, fiz questão de ser honesta e contava para ele sobre as etapas do fim do relacionamento pelas quais eu passava. Para completar, o meu amigo secreto também tinha problemas de ereção, pelos quais eu também me culpava, sozinha. “Deve ser eu o problema”, eu pensava, já que eu já era a culpada pelo meu casamento falido. E confesso que não tinha força para mais um fracasso naquele momento, confesso que tudo o que não queria era me sentir feia. Tudo o que queria era agradá-lo, talvez acreditando que erroneamente assim eu teria valor. Acordamos em transar sem camisinha. Achei que isso “resolveria o problema” e assumo essa culpa, muito embora ache que ela deva ser dividida com ele. Mas, um dia, cerca três meses e uns 6 encontros, cansada da frieza que ele demonstrava em tudo, da arrogância e do distanciamento que ficou mais claro quando fui selecionada para ser efetivada na empresa, decidi pular fora. Mas algo deu errado. Ou: em português claro, o anticoncepcional de emergência deu errado, a pílula do seguinte não funcionou. Como durante 10 anos de vida sexual ativa cheguei a ser paranoica com a contracepção, esperei impacientemente pelo dia que poderia fazer o exame de sangue. E 11 dias depois, deu positivo. Meu desespero foi enorme, mas a minha decisão estava tomada desde o primeiro momento: eu quis fazer um aborto. Não tinha sequer assinado o contrato do novo emprego pelo qual tanto batalhei, estava arrasada com o fim do casamento, era de um rapaz que conhecia pouco e que cada vez mais se mostrava extremamente frio, e eu não tinha família na cidade nova. Minha decisão estava tomada. Se eu tivesse que morrer tentando efetivar minha opção, eu morreria. Eu não queria contar para ele. Porque não confiava nele. Não confiava na reação dele, não confiava na discrição dele sobre um acontecimento que deveria ser profundamente íntimo, privado, ainda mais em um país onde tal decisão era ilegal. Porque eu sentia vergonha e porque tive medo de sentir vergonha por toda a minha vida. Porque tinha convicção que aquela decisão era minha, que o corpo era meu, assim como o risco que eu assumia com aquela decisão. Mas eu contei para ele, porque após refletir muito, percebi que não era justo que eu assumisse aquilo tudo sozinha, psicologicamente e financeiramente. Não deixei espaço para que ele opinasse, mas ele fez questão de dizer que não queria. Na véspera do aborto, ele também fez questão de manter o discurso sobre “ficar sozinho”. Porém, após o aborto, ele apareceu na minha casa para ver como eu estava. Quando pedi para que ele não contasse para ninguém, embalada pela minha vergonha, ele deu a entender que estava com outra menina de forma fixa há um certo tempo. Quando perguntei de forma explícita, ele confirmou. Enfim, ficou claro: eu era “a outra” e eu não sabia. Ele gritou comigo dizendo que não tinha compromisso comigo, que não tinha obrigação de fidelidade e que não era “tão fixo assim”. E não me deu maiores explicações, pois para ele, ele não tinha que me explicar nada. Tudo isso no dia do aborto. Como se o meu dia não tivesse sido suficientemente difícil. Como se ele pudesse ser ainda mais cruel. Por isso, seja lá quem for que esteja lendo esteja relato e esteja passando por essa situação, pense bem se precisa contar para ele, caso não confie nele. Mas apesar disso, apesar dele, foi um dia bom. A semana que antecedeu aquele dia foi a pior semana da minha vida. O fato de ser ilegal faz com que o processo seja desesperador, pois quem “negocia” com você sabe que você não tem escolha. Tive muito medo de morrer. Tive medo de ser presa. Mas nem isso me impediu de fazer. No primeiro ultrassom não aparecia nada, afinal, nem havia nem tempo para registro de atraso de menstruação quando fiz o exame. Nunca compartilhei da ideia de que ali era uma criança. No segundo ultrassom, aparecia algo: naquele ponto, era um conjunto de células conforme comprova a ciência e tudo o que eu queria era tirar aquilo de mim, interromper aquele processo. Quando acabou o aborto (por sucção em uma clínica clandestina), tudo o que senti foi alívio. Uma amiga foi me ver e comentou que naquela semana foi a primeira vez que me viu serena e com um leve sorriso no rosto. Eu estava viva. Tive amplo apoio das minhas amigas. Vi e vivi a força da solidariedade feminina. E graças a elas e à coragem que assumi com aquela decisão, minha vida poderia continuar. Eu poderia viver os meus sonhos. Eu poderia recomeçar. Segui minha vida depois daquilo. Como eu estava em tratamento por causa da depressão na qual entrei após a separação, tive acompanhamento e por um período de seis meses depois daquilo, tomei antidepressivos. Mas nunca me arrependi. Sim, me senti muito culpada por não ter usado a camisinha. E me arrependi enormemente por ter me envolvido com aquela pessoa, o meu amigo secreto. Mas fico aliviada por pensar que o aborto permitiu que eu seguisse com a minha vida e me afastasse dele. Cerca de três meses depois, assinei o contrato e iniciei o emprego novo. Mobiliei o meu apartamento – no qual vivia sem móveis ainda por conta da separação – e me recuperei. O ano que se seguiu foi muito feliz, marcado por conquistas profissionais que não teriam ocorrido com uma gestação ou uma criança a ser criada sozinha. Gostaria de não ter isso na minha história, mas tenho. Sempre vou pensar nisso, mas não como um erro: como uma escolha difícil que tive que fazer e da qual não me arrependo. E teria sido menos difícil e dramática se tivesse sido um procedimento legal.
Foi difícil, mas o aborto me libertou.
Eu fiz um aborto do #meuamigosecreto. Meu amigo secreto deu em cima de mim por um ano antes de conseguir algo. Meu amigo secreto sabia que eu era casada. Meu amigo secreto sabia que eu não estava bem. Nem na vida pessoal, nem na vida profissional. Não apenas porque eu dizia (várias vezes), mas porque era claro. Após um assalto traumático que me dez perder quase tudo o que eu tinha, várias mudanças que se seguiram a isso, desempregada contando apenas com um "estágio" e após ter perdido injustamente a vaga em um concurso público, eu estava diagnosticada com depressão. Emagreci 10 kilos naquele semestre. Era visível e hoje mal compreendo como alguém pode se interessar sexualmente por alguém naquele estado. Pensando bem, hoje compreendo. Era uma situação prática para ele. Eu era estagiária na empresa na qual o meu amigo secreto trabalhava. Uma clara diferença de posição que lhe deu segurança para insistir em suas investidas, mesmo diante das minhas negativas. Acreditei. Após ficar claro que o casamento caminhava para o fim que me parecia necessário para tomar o caminho profissional que eu preferia, uma vez que o meu companheiro mais uma vez anunciou que se mudaria para mais outra cidade, cedi. O meu amigo secreto dizia que era um momento só nosso. Ele se dizia apaixonado. Mas, ao mesmo tempo, ele dizia (repetidas vezes) que queria ficar sozinho, que precisava se encontrar. Eu, carente, depressiva, acreditei. Mas ocorre que ficar sozinho para ele era ficar com outra ao mesmo. Só que eu não sabia. Enquanto isso, eu, que me sentia culpada por tudo, fiz questão de ser honesta e contava para ele sobre as etapas do fim do relacionamento pelas quais eu passava. Para completar, o meu amigo secreto também tinha problemas de ereção, pelos quais eu também me culpava, sozinha. “Deve ser eu o problema”, eu pensava, já que eu já era a culpada pelo meu casamento falido. E confesso que não tinha força para mais um fracasso naquele momento, confesso que tudo o que não queria era me sentir feia. Tudo o que queria era agradá-lo, talvez acreditando que erroneamente assim eu teria valor. Acordamos em transar sem camisinha. Achei que isso “resolveria o problema” e assumo essa culpa, muito embora ache que ela deva ser dividida com ele. Mas, um dia, cerca três meses e uns 6 encontros, cansada da frieza que ele demonstrava em tudo, da arrogância e do distanciamento que ficou mais claro quando fui selecionada para ser efetivada na empresa, decidi pular fora. Mas algo deu errado. Ou: em português claro, o anticoncepcional de emergência deu errado, a pílula do seguinte não funcionou. Como durante 10 anos de vida sexual ativa cheguei a ser paranoica com a contracepção, esperei impacientemente pelo dia que poderia fazer o exame de sangue. E 11 dias depois, deu positivo. Meu desespero foi enorme, mas a minha decisão estava tomada desde o primeiro momento: eu quis fazer um aborto. Não tinha sequer assinado o contrato do novo emprego pelo qual tanto batalhei, estava arrasada com o fim do casamento, era de um rapaz que conhecia pouco e que cada vez mais se mostrava extremamente frio, e eu não tinha família na cidade nova. Minha decisão estava tomada. Se eu tivesse que morrer tentando efetivar minha opção, eu morreria. Eu não queria contar para ele. Porque não confiava nele. Não confiava na reação dele, não confiava na discrição dele sobre um acontecimento que deveria ser profundamente íntimo, privado, ainda mais em um país onde tal decisão era ilegal. Porque eu sentia vergonha e porque tive medo de sentir vergonha por toda a minha vida. Porque tinha convicção que aquela decisão era minha, que o corpo era meu, assim como o risco que eu assumia com aquela decisão. Mas eu contei para ele, porque após refletir muito, percebi que não era justo que eu assumisse aquilo tudo sozinha, psicologicamente e financeiramente. Não deixei espaço para que ele opinasse, mas ele fez questão de dizer que não queria a gestação, que queria o aborto. Na véspera do aborto, ele também fez questão de manter o discurso sobre “ficar sozinho”. Porém, após o aborto, ele apareceu na minha casa para ver como eu estava. Quando pedi para que ele não contasse para ninguém, embalada pela minha vergonha, ele deu a entender que estava com outra menina de forma fixa há um certo tempo. Quando perguntei de forma explícita, ele confirmou. Enfim, ficou claro: eu era “a outra” e eu não sabia. Ele gritou comigo dizendo que não tinha compromisso comigo, que não tinha obrigação de fidelidade e que não era “tão fixo assim”. E não me deu maiores explicações, pois para ele, ele não tinha que me explicar nada. Tudo isso no dia do aborto. Como se o meu dia não tivesse sido suficientemente difícil. Como se ele pudesse ser ainda mais cruel. Por isso, seja lá quem for que esteja lendo esteja relato e esteja passando por essa situação, pense bem se precisa contar para ele, caso não confie nele. Mas apesar disso, apesar dele, foi um dia bom. A semana que antecedeu aquele dia foi a pior semana da minha vida. O fato de ser ilegal faz com que o processo seja desesperador, pois quem “negocia” com você sabe que você não tem escolha. Tive muito medo de morrer. Tive medo de ser presa. Mas nem isso me impediu de fazer. No primeiro ultrassom não aparecia nada, afinal, nem havia nem tempo para registro de atraso de menstruação quando fiz o exame. Nunca compartilhei da ideia de que ali era uma criança. No segundo ultrassom, aparecia algo: naquele ponto, era um conjunto de células conforme comprova a ciência e tudo o que eu queria era tirar aquilo de mim, interromper aquele processo. Quando acabou o aborto (por sucção em uma clínica clandestina), tudo o que senti foi alívio. Uma amiga foi me ver e comentou que naquela semana foi a primeira vez que me viu serena e com um leve sorriso no rosto. Eu estava viva. Tive amplo apoio das minhas amigas. Vi e vivi a força da solidariedade feminina. E graças a elas e à coragem que assumi com aquela decisão, minha vida poderia continuar. Eu poderia viver os meus sonhos. Eu poderia recomeçar. Segui minha vida depois daquilo. Como eu estava em tratamento por causa da depressão na qual entrei após a separação, tive acompanhamento e por um período de seis meses depois daquilo, tomei antidepressivos. Mas nunca me arrependi. Sim, me senti muito culpada por não ter usado a camisinha. E me arrependi enormemente por ter me envolvido com aquela pessoa, o meu amigo secreto. Mas fico aliviada por pensar que o aborto permitiu que eu seguisse com a minha vida e me afastasse dele. Cerca de três meses depois, assinei o contrato e iniciei o emprego novo. Mobiliei o meu apartamento – no qual vivia sem móveis ainda por conta da separação – e me recuperei. O ano que se seguiu foi muito feliz, marcado por conquistas profissionais que não teriam ocorrido com uma gestação ou uma criança a ser criada sozinha. Gostaria de não ter isso na minha história, mas tenho. Sempre vou pensar nisso, mas não como um erro: como uma escolha difícil que tive que fazer e da qual não me arrependo. E teria sido menos difícil e dramática se tivesse sido um procedimento legal.
L'illégalité de votre avortement a-t-elle affecté vos sentiments ?
Sim. Muito.
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Solidariedade das amigas
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